quinta-feira, 10 de abril de 2014

A ILEGALIDADE DA OSTENSIVIDADE DA GM-RIO (PARTE 2)

O MINISTÉRIO DAS CIDADES pronunciou:

PARECER CONJUR/MCIDADES nº. 1409/2006. GUARDA MUNICIPAL - COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL:  As guardas municipais são desprovidas de competência para atuar no campo da segurança pública, não podendo, pois, ser investidas de atribuições de natureza policial e de fiscalização do trânsito. Sua atuação se restringe à proteção dos bens, serviço e instalações do ente municipal (inteligência do art. 144, § 8º, da CF/88). (Processo nº. 80001.004367/2006-25).

Assim recentemente posicionou o STF:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. GUARDA CIVIL METROPOLITANA. DELINEAMENTOS DAS COMPETÊNCIAS OUTORGADAS AOS MUNICÍPIOS. RELEVÂNCIA DA MATÉRIA. JUÍZO DE RETRATAÇÃO:
RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO IMPUGNADA
.
DECISÃO: O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo julgou  procedente a ação direta estadual e declarou a inconstitucionalidade do inciso I do artigo 1º da Lei nº 13.866/2004, do Município de São Paulo, legislação que fixa atribuições da Guarda Civil Metropolitana. A ementa do acórdão está assim redigida (folha 88):
 “Ação Direta de Inconstitucionalidade – art. 1º, inc. I da Lei n. 13.866/2004, do Município de São Paulo, que fixa atribuições da Guarda Civil Metropolitana – Art. 147 da Constituição Estadual – Proteção dos bens, serviços e instalações municipais – Matéria debatida é atinente à segurança pública – Preservação da ordem pública – Competência das policias, no âmbito do Estado – Atividade que não pode ser exercida pelas guardas municipais – Extrapolação dos limites constitucionaisAção direta julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade do dispositivo”
Brasília, 17 de abril de 2013.
Ministro LUIZ FUX
Relator
 
Na ADIN n. 2.827-RS, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a taxatividade do rol disposto no artigo 144, sendo defesa aos Estados-membros a criação de órgão de segurança pública diverso daqueles previstos no mencionado.·.
(...) Observância obrigatória, pelos Estados-membros, do disposto no art. 144 da Constituição da República. Precedentes. 6. Taxatividade do rol dos órgãos encarregados da segurança pública, contidos no art. 144 da Constituição da República. Precedentes. 7. Impossibilidade da criação, pelos Estados-membros, de órgão de segurança pública diverso daqueles previstos no art. 144 da Constituição. Precedentes.
Ora, se o rol do artigo 144 da CR é taxativo, não se pode tolerar a atuação da Guarda Municipal em exercício de polícia ostensiva (preventiva).
O Desembargador Federal Aristides Medeiros assevera:
Consoante estabelecido no art. 144, caput, da Constituição Federal, os órgãos incumbidos da segurança pública, isto é, da segurança geral, são apenas (numerus clausus) os ali relacionados, ou seja, a polícia federal, a polícia (rectius: patrulha) rodoviária federal, a polícia (rectius: patrulha) ferroviária federal, as polícias civis e as polícias militares, além dos corpos de bombeiros militares. (MEDEIROS, Aristides. Guarda Municipal e Segurança Pública. Revista Jus Vigilantibus, Sexta-feira, 10 de julho de 2009).
O Excelso Pretório, quando provocado, assim tem acordado, conforme se depura da decisão da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 236-8/RJ:
b) os órgãos arrolados em tal dispositivo constituem numerus clausus,  não comportando a inclusão de outras corporações policiais; [...]  d) e essa contrariedade se deu porque o elenco de órgãos federais e estaduais contidos no transcrito art. 144 da Constituição Federal é exaustivo e não exemplificativo. Por essa razão, a União, os Estados e os Municípios não podem criar novas organizações nesse setor específico da administração pública. (Ministro Octávio Galloti. DJ 17.10.1991). 
Igualmente, a Advocacia Geral da União tem se manifestado: “O rol taxativo dos órgãos integrantes da segurança pública, como se percebe, é exaustivo, taxativo. Não se vislumbra a possibilidade de criação de órgão distinto daqueles elencados no transcrito art. 144.” (Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3644-1/600. Advogado Geral da União Álvaro Augusto Ribeiro Costa. DJ 17.02.2006).
Salientamos que segurança pública é necessidade precípua de Estado e não de Governo; em outras palavras, não se pode tratar o sistema de segurança pública como medidas de governo, imediatistas e flexíveis a cada momento político, mas como fundamento de um Estado, como adverte Lazzarini (1999, p.119):
Inicialmente alerto que o uso político-partidário vem exacerbando o municipalismo, ameaçando desmontar estruturas da União e dos Estados, com resultados duvidosos, quando não danosos em termos de eficiência. Lembro que segurança pública é área extremamente sensível, não sendo recomendável fazer-se nela experiências extravagantes.
A Corte Superior do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, ao fazer o exame de constitucionalidade de lei municipal de Juiz de Fora que delegava à guarda municipal poder de polícia para ações de preservação da ordem pública e polícia ostensiva, decidiu:
Ação Direta de Inconstitucionalidade - Lei do Município de Juiz de Fora, promulgada pela Câmara Municipal após veto do Prefeito, por inconformidade com os parâmetros da Constituição Estadual. Matéria de segurança pública, relativa às Polícias Civil e Militar, afetas à competência dos Estados-membros. Inconstitucionalidade declarada. Ementa da Douta Procuradoria-Geral de Justiça: Ação Direta de Inconstitucionalidade - Lei Municipal - Registro estatístico de índices locais de violência e criminalidade - Interesse local - Segurança pública - Inconstitucionalidade. O interesse local a justificar o exercício do Poder de legislar do Município deve guardar conexão lógica com a competência fixada pela Carta Política. Não compete ao Município legislar sobre matéria que tenha vinculação com segurança pública e que, portanto, encontre-se sob a tutela do Estado-membro. (MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.0000.00.182373-1/000. Rel. Des. Rubens Xavier Ferreira. DJMG de 11.05.2001).
Neste rumo, recortam-se as palavras do Procurador de Justiça Alberto Vilas Boas (1993, p. 91) apud Minas Gerais (2001), salientando que a segurança pública não se constitui em matéria de interesse local, estando afeta aos interesses dos Estados e da União.
Sendo assim, é possível afirmar que a manutenção e restauração da ordem pública afetada por comportamentos socialmente reprováveis devem ficar a cargo da União e dos Estados-Membros que detêm, inegavelmente, a prerrogativa constitucional de criar políticas públicas que objetivem preservar os interesses da comunidade nesta seara. (...) A instituição desta obrigação jurídica gera perplexidade na medida em que o ente municipal arvora-se em usurpar uma prerrogativa própria e lógica das entidades estaduais e federais incumbidas de efetivar a polícia de manutenção da ordem pública consistente em manutenção de banco de dados aptos a demonstrar à máxima ou mínima efetividade do exercício desta competência constitucional.
Adepto a este posicionamento, o Procurador da República Alexandre Halfen da Porciúncula expressa que tanto a doutrina como a jurisprudência estão a pacificar que as questões de segurança pública, da qual obviamente faz parte àquelas atinentes ao trânsito, constitui-se em valores que suplantam o interesse meramente local dos municípios, motivo pelo qual a Carta Superior atribuiu sua guarda somente à União (art. 142, in fine) e aos Estados-Membros (art. 144, caput e § 5º). (BRASIL. Ministério Público Federal. Procuradoria da República no Município de Foz do Iguaçu/PR. Ação Civil Pública n. 2006.70.02.006759-1. Procurador Alexandre Halfen da Porciúncula. Foz do Iguaçu: 2006).
A inserção do Município no contexto da segurança pública foi por demais restritas. Com efeito, atribuiu-lhe o constituinte, no parágrafo 8º, do art. 144, poder de constituir guardas municipais, mas cuidou em fechar o parêntese, estabelecendo que as atribuições destas, no campo material, ficariam limitadas à proteção dos bens, serviços e instalações da municipalidade, na forma da lei.

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